Na linha de fôlego: o combate silencioso pela respiração dos leitões
No Simpósio Brasil Sul de Suinocultura (SBSS), a Dra. Maria José Clavijo Michelangeli apresentou soluções inovadoras para proteger a saúde respiratória de leitões no pós-desmame
A médica veterinária e pesquisadora Dra. Maria Jose Clavijo Michelangeli conduziu palestra esclarecedora sobre o tema “Saúde respiratória de leitões após o desmame: compreendendo os patógenos endêmicos”. Foto: Andressa Kroth
Na suinocultura brasileira, abriu-se um verdadeiro palco de conhecimento para debater um dos desafios mais persistentes da produção animal: as doenças respiratórias em leitões. Durante o Painel Sanidade do 17º Simpósio Brasil Sul de Suinocultura (SBSS), a médica veterinária e pesquisadora Dra. Maria Jose Clavijo Michelangeli conduziu uma palestra esclarecedora sobre o tema “Saúde respiratória de leitões após o desmame: compreendendo os patógenos endêmicos”.
O evento, promovido pelo Núcleo Oeste de Médicos Veterinários e Zootecnistas (Nucleovet), transformou o Centro de Cultura e Eventos Plínio Arlindo de Nes, de Chapecó (SC), em um ponto de convergência de ideias, tecnologia e inovação. A apresentação da Dra. Maria Jose trouxe à tona um aspecto crítico, muitas vezes subestimado: o impacto que o desmame exerce sobre a saúde respiratória dos leitões. Este período, marcado por intensa mudança alimentar, separação da mãe e adaptação a novos ambientes, impõe alto nível de estresse aos animais e abre caminho para que bactérias endêmicas causem infecções potencialmente devastadoras.
Segundo a especialista, essas doenças podem representar até 45% das mortes na fase de creche e ultrapassar 60% nas fases de recria e terminação. “As doenças respiratórias bacterianas em suínos são complexas e multifatoriais. Resultam da interação entre agentes infecciosos, fatores ambientais e práticas de manejo, impactando negativamente o ganho de peso, a conversão alimentar, os custos de produção e a taxa de mortalidade”, destacou.
A palestrante enfatizou que o combate a esses patógenos exige uma abordagem integrada, que combine vacinação estratégica, melhoria das condições ambientais, dietas balanceadas e de fácil digestão, biosseguridade rigorosa e monitoramento contínuo. “Não se trata apenas de tratar doenças, mas de preveni-las de forma inteligente e sustentável”, afirmou. Durante sua fala, apresentou dados recentes sobre protocolos de vacinação com dose de reforço para Mycoplasma hyopneumoniae. A estratégia, já adotada por algumas empresas, mostrou resultados promissores em cenários com alta pressão de infecção. “Estamos vendo uma oportunidade concreta de controle mais efetivo. O reforço vacinal aplicado no início da recria ou no início da terminação tem mostrado resposta positiva tanto nos dados de campo quanto em análises laboratoriais”, explicou.
A trajetória de Maria Jose Clavijo Michelangeli, confere peso a cada recomendação. Formada em Medicina Veterinária pela Universidade Central da Venezuela e doutora pela Universidade de Minnesota, construiu uma carreira internacional que combina docência, pesquisa e atuação prática. Lecionou na Venezuela, atuou como veterinária de campo, foi pesquisadora e trabalhou como veterinária de garantia de saúde na PIC, líder global em genética suína. Hoje, de volta à pesquisa e ao ensino, também atua como consultora para empresas de diferentes países, ajuda a implementar programas de controle e erradicação de doenças endêmicas.
Além de apresentar soluções técnicas, sua palestra teve um tom inspirador. “O Simpósio Brasil Sul de Suinocultura (SBSS), nos dá a oportunidade de discutir algo extremamente aplicado e atual. São ferramentas que podem auxiliar imensamente o produtor no combate às doenças respiratórias na terminação. Mas, para que funcionem, é preciso compreender o problema em toda a sua complexidade e estar disposto a investir em prevenção”, ressaltou.
A pesquisadora também abordou a presença de patógenos considerados epidêmicos em alguns países e sistemas de produção, bem como a atuação conjunta de agentes que formam o chamado complexo respiratório suíno. Apresentou ferramentas para diagnóstico e destacou os custos significativos que essas doenças acarretam, incluindo a dependência crescente do uso de antibióticos. Chamou atenção para o papel crítico das infecções virais, que podem agir como gatilhos ou aceleradores das bactérias, tornando essencial compreender e controlar esses vírus para obter sucesso no combate às infecções bacterianas. Explicou que os patógenos respiratórios são complexos porque possuem comportamento oportunista, persistem por longos períodos no ambiente e podem contaminar tanto pelas vias aéreas superiores quanto por contato nasal direto.
Segundo ela, com dados compilados ao longo do tempo, é possível melhorar a seleção de vacinas, otimizar o uso de medicamentos, identificar a origem de surtos e reorganizar fluxos e misturas de lotes, avançando para uma prevenção realmente proativa. Ao tratar do Mycoplasma hyopneumoniae, ressaltou sua transmissão lenta e o diagnóstico desafiador, reforçando a necessidade de vigilância contínua e de estratégias adaptadas à realidade de cada granja.
Ao final, deixou uma mensagem aos participantes, “cada respiração saudável de um leitão é mais do que um sinal de vida, é um indicativo de que estamos no caminho certo para uma produção mais eficiente, responsável e sustentável. Proteger o pulmão do animal é proteger o fôlego da suinocultura brasileira”. E lembrou que, no campo, cada segundo conta, “se cuidarmos do ar que entra, estaremos garantindo o futuro que sai — em forma de produtividade, bem-estar e longevidade para toda a cadeia”.